segunda-feira, 13 de outubro de 2008

Ao mestre W. S., com carinho.

Este é um canto novo: um lugar e um hino. Nele estão postados textos poéticos de minha autoria que buscam ser um tranquilo lugar à meditação e uma singela canção de amor a todos os seres. Todos são bem-vindos.
A cópia parcial ou total dos textos poéticos é permitida, desde que seja citada a autoria dos mesmos.
Um fraterno abraço da paz. Do poeta, Ribeiro Halves.
Veja tembém:
http://ocantonovo2.blogspot.com/

Círculo e Cruz.

A AURORA

A Aurora se faz.
É chegada a hora.
O tempo oportuno se anuncia,
nada pode deter o Sentido.

O rio segue seu curso.
O vento canta o Novo Hino.
O fogo mais vivo, ilumina,
e a Terra sustenta seus filhos.

Deus em toda parte
escreve a Boa Nova:
a Aurora anuncia-se no Horizonte.

Cruz celta.

A CRUZ E O CÍRCULO

Por entre o Círculo do perene,
onde o centro está em toda parte
e a circunferência em parte alguma,
a Cruz repousa dinâmica
e se con-verte em árvore da Vida.

Nela floresce o imóvel ponto,
a movimentar estrelas e astros...
nela está circunscrito o Fruto
do mutável destino humano;
em um só tempo laço e abraço,
encruzilhada e encontro.

O SÁBIO E A DIVINDADE

O sábio sabe
aquele sabor
que há na graça
de ser amigo...
aquele sabor
do equilíbrio
entre amor e rigor...
aquele sabor
dos sábios
em viver a palavra:
com-partilhando, refletindo,
unindo, ponderando.

Há nisso tudo
a presença do Divino
conosco (contigo):
da (in)visível graça,
presença sábia
que é humana
(demasiado humana)
de tão divina: Jesus Cristo,
nossa Páscoa;
nosso Irmão,
nosso Mestre,
nosso Amigo.

"Horse racing at Hy Brazil" (Jack B. Yeats)

CANTO DAS FADAS (Hy Breasil)

Flores pequenas
em mãos de fadas
colhem florais
porções de luz.

A tarde é cedo,
a vida é breve
e o sol se põe
além... na Ilha Encantada.

A SAGA

A saga segue a converter
a espada em flor
na poesia possível de vida.

Entre uma estrela e outra
há qualquer coisa de antigo,
esse sempre tão novo
aos olhos amigos
do fogo, da chuva,
da brisa, da terra
oferta em árvores pródigas
em folhas, flores e frutos...
estações e anos.

EM UM JARDIM SECRETO

Por entre a umidade,
musgos e avencas delicadas,
o caracol descreve seu rastro.

Imóvel, o poeta contempla
a paisagem sublime de um poema
e sente um nó na garganta.

A umidade brota dos olhos,
orvalha o delicado poema
e o poeta volta-se para casa.

Pangur Bán

O ERUDITO E SEU GATO (Baseado em um poema homônimo do século IX)

O erudito descreve
com refinado cálculo
a órbita dos astros.

Seu gato, Pangur Bán,
descreve num salto
sua trajetória no ar.

O erudito e seu gato
contentes movimentam
emoções constelares.

CALIGRAFIA

Nas mãos que descrevem
o movimento da letra
há sempre algo de sagrado.
Algo como criar
universos a partir do nada,
algo como o surgir
de um milagre
aonde não se espera,
algo como
um gesto da graça:
oferta aberta,
cheia de dádiva...
Assim como
os anjos copistas
a descreverem nossas vidas
no útero livro
da eternidade.

ESCATOLOGIA I

Quando o gafanhoto
gordo, não mais voa; (Ecl. 12,5)
e o maduro fruto,
grave, a terra procura...
então se rasga o véu
que o tempo vestia; (Lc 23, 45)
e nua eternidade
reveste toda criatura.

luz só brisa...

DO AR (O Vento)

No ar aprender
o sentido da liberdade...
o que não pode conter
pois em tudo está contido,
o que tudo envolve
e nos percorre;
amniótico elemento
que nos alimenta.

Saber do ar
pomba só asa,
ave só vento,
oceano só onda;
duna inconsútil, invisível,
aonde nos movimentamos...
e somos;
o possível som
em pleno silêncio.

Movediço...
O mais líquido
dos elementos,
o primeiro e o derradeiro
dos signos
a gritar em nós...
choro e suspiro.

UMA NOVA BENÇÃO

Que a brisa,
borboleteando,
afague teus cabelos.

Que o mar,
tão indomável,
inspire teus passos.

Que a chama do amor
aqueça tua pele,
suavemente.

Enquanto a Terra,
tão materna,
cuide das entranhas de tua alma.

BENÇÃO À ÁRVORE (quando do plantio)

Deus criador,
dador de toda vida,
pai-mãe da Terra
e das estrelas;
abençoe e guarde
esta pequena árvore,
para que ela se torne
robusta e bela.

Sê abençoada
pequena árvore
com uma longa vida
cheia de graça;
testemunho
da dádiva divina.

Abençoada sejam
tuas folhas,
o teu tronco,
(as tuas flores,
os teu frutos,)
as tuas raízes;
que tua sombra seja amena
e tua presença amiga.
Sê abrigo
aos seres da terra
e repouso aos seres dos ares.

Abençoada sejas,
pequena árvore,
com muitos anos.

Sobre minha casa, a Ursa Maior...

CONSTELAÇÃO

O condutor de almas
segue o sentido das águas:
lágrimas e rios,
marés e mares.
Ele sabe
que o fio que tece
a malha que aquece
a alma
é feito do mesmo no-
ve(h)lo que prende
os destinos
e (d)escreve a vida,
entre os vivos
e os viventes.

Ele sabe
que entre uma estrela
e outra estrela
há uma ponte
(in)visível
que en-laça tudo
a todos - ao todo
(entre força e sentido,
entre te(n)são e fluxo,
em vibr-ação e ritmo)
e que alguns insistem
(eu entre eles)
a chama(r) de AMOR.

A TERRA

Quando a Terra Mãe
encanta-se de flores,
borboletas cores,
trovas d'amour
e sonhos antigos;
(...)
o Tempo está maduro
e o Bardo (seguramente)
entoa a Canção de Dádiva-vida
e a Graça querida
é repartida entre
os filhos da Terra.

PERTENCIMENTO

O sábio sabe
a colher seus frutos
cotidianos
que a vida,
essa brisa a brincar
com o mar sem tempo,
sente que existe,
em cada momento,
por entre o fatídico golpe
e o esperado abraço,
(seja aquele gole mais doce
ou a mais amarga dose)
o mesmo e único
sinal da dádiva
a brincar com a verdade
oculta aos olhos profanos.

A catedral e o labirinto...

NOTRE DAME DE CHARTRES

A penumbra
de teu ventre,
entre o repouso
labirinto
e o peregrinar
das pedras em voo,
gesta-se,
sem bruma
ou nuvem outra,
a luz do som
azul-safira
que em silêncio
reverbera-se;
à Maria Negra
da cripta
céu candeias:
à flor da Terra
pilar eleva-se.

Mãe, amiga, irmã, amante...

DA TERRA

Saber da Terra sua trilha,
conhecer seu seio
acolhedor e perene,
ser com ela sempre:
amigo, irmão, amante.

Saber seu poder, ternamente,
aquilo que há de rocha
e resistência (sua força antiga),
o que rompe o vento
e acolhe as águas com fúria.

Mas também saber da Terra
aquilo que passa... duna.
O que sustenta o fogo e úmida recobre:
vento aberto ao curso das águas,
(lago, fonte, chuva)
a ondulante areia ao sabor das brisas.

Saber da Terra seu sabor,
aquilo que há de maduro, seu fruto:
as estações e os vulcões,
os terremotos e os carvalhos,
bosques e colheitas,
o sal que tempera os mares.

Saber da Terra sua maternidade,
o ventre e o cálice, a estrada aberta,
o sentido oculto da terra
a guardar a semente, a florir das frutas;
o que nos sustenta os passos.

Enfim, saber da Terra sua materialidade;
o aprendizado constante das montanhas...
o sentido das campinas, o horizonte das praias.
Aquilo que se move, aquilo que fica:
o berço de toda vida, útero de toda dádiva.

domingo, 12 de outubro de 2008


Nascer do sol no mar ao sul...

MAR SELVAGEM

Planície semovente, movediça, como uma espécie diversa de duna, líquida, qual coaduna espaços: sublime sereia, bela e terrível.

No dentro: viscerais cardumes, decantados náufragos, abissais moradores (sem casa)... No fora: a epiderme é um horizonte ondulante que, como manadas ou bandos, estão em disparada (com medo de que mesmo? ninguém sabe!)... No entre: o que circunda é o limite impreciso, a borda que envolve o conteúdo, copo ou vaso... Por entre: exóticos cardumes (voo), alguma água, ar em movimento (serenos e trágicos)...

O espaço da planície movediça situa-se em um sempre: a carne é um suor bem temperado a sustentar toneladas de ferro e aço; e nas amplidões, as distâncias apequenam o grande (tal qual estrelas no céu nocturno). Amplidão que, como os espaços estelares, é única... indivisa e igual; e por um capricho humano constelou-se em domínios nomeados. (Mas como pode existir tal ficção chamada fronteira ou definição? Como delimitar aquilo que está aberto no espaço?)

Movendo-se selvagem (como as manadas já citadas) é um mesmo sempre: planície indomável.

PEDAGOGIA NATURAL

A terra em seu silêncio de paisagem e colinas,
no arpejo da brisa a bailar árvores antigas...
fala-nos daquela verdade que sempre existe
a rebrilhar em cada coisa e por toda parte.

Ela nos diz (silente) de suas irmãs estrelas,
nossas mães solares, e de sua sabedoria antiga;
constelada em seus brilhos a cintilar por vastos espaços.
Fala-nos, também, do Mistério que está escrito
nos grãos de areias de todas as praias;
esses pequeninos livros que, volume após volume,
tecem o tear e o tecido da vida.

(...)

Fala-nos em tudo: no movimento dos rios
e no repouso dos lagos...
na imobilidade das serras e no devir das dunas...
no ir e vir dos ventos,
nas estações das flores e chuvas;
nas mudanças perenes da lua...
Ela fala em sussurro, quase silêncio...
como aquele que cabe em uma estrela,
em uma rosa desabrochando
em poema a ser escrito,
em uma folha em branco(...)

(...)

O que ela nos fala
está no mundo oferto...
e inscrito
no coração humano.

Vitral da Kilmore Church (Church of Scotland)

SAUDADE

Lá aonde a vida (movimento)
tece no ar suas brisas
há qualquer coisa de repouso
enternecido de asas;

um lugar para viver,
dormir no regaço, largo,
à beira de todos os seres,
à beira de todos os lagos.

Para que depois, somente
após, junto aos seres,
vivermos a lembrar... (solitários)
a solidariedade de laços que somos:

os mundos visíveis,
as eras que temos,
as vidas que fomos,
os encontros que acon-tece-ram.

DAS ESTAÇÕES

Uma brisa a brincar
com a velha árvore
carregada de anos.

Em cada ano, o sabor
da semente das manhãs
pródigas de frutos.

Em cada fruto,
a carne pretérita...
oferta em doce.

Na raiz mais amarga
aquilo que se re-colhe
como promessa presente:

folhas, flores, frutos
de antigas árvores
e suas (dádivas) sombras... repousantes.

DIVINA PRESENÇA

Escrita em todas as folhas
de cada árvore.

Sussurrada em cada brisa,
como que soletrada.

Inscrita em toda flor
com gotas de orvalho.

Encantada na brasa viva
a arder em toda fornalha.

(...)

Aqui estás, sabedoria divina,
em cada um e em toda parte;

Presença da totalidade
nos infinitos presentes da vida.

Guapuruvu no campus da UFRPE - Recife (PE; Brasil) (Departamento de Eng. Florestal)

ORAÇÃO À ÁRVORE ANTIGA

Bendita sejas
árvore antiga,
irmã e amiga,
filha de Deus;
dos seres
não-caminhantes
és a primeira.

Bendita sejas,
querida criatura,
por tua lição
(serena e silente)
à criatura humana:

de gratuidade,
na oferta de tua
amena sombra
sob o sol escaldante;
de paciência
diante das mudanças
das estações e anos;
de permanência
sobre intempéries
e adversos tempos,
na busca do alto.

Bendita sejas,
árvore antiga,
o primeiro dos seres
não-caminhantes,
por tuas raízes
por tuas folhas
(flores e frutos)
voltados ao céu.

Bendita sejas;
amém.

Em uma lagoa, uma abelha visita um nenúfar...

DA ÁGUA

Sorver o fluir, lento...
em gotas de chuva,
orvalho, lágrima...
o que se estende
acima como nuvens
ou se estende
abaixo como riacho... mares.

Lunar elemento
entranhado na carne...
o que lento modela,
paciente e persistente,
o leito dos rios,
o duro da terra,
os espaços dos ares...

Saber da água
seu sabor preci(o)so
e delicado
em acordo íntimo
com a terra e os ares...
a turvar o espelho
do lago,
a tocar um doce
acorde no telhado...
a denunciar
a emoção repousada
em tua face.

Crepúsculo...

ORAÇÃO VESPERTINA

Graça Te damos, Deus,
pela oportunidade
de ter vivido mais um dia
em Tua presença;
luz infinita que inflama
o coração de Tuas criaturas.
Obrigado pela graça
da possibilidade de em minha vida
consagrar tudo (cada coisa, cada lugar)
ao resplendor da beleza
de Tua face divina.
Faz de minha vida
sinal de Tua existência,
faz de minha alma
lugar para Tua tenda,
faz que nessa terra
floresça a paz que é Tua.
Amém.

ESCATOLOGIA II

Aqui na terra
alguns dizem:
"Depois da morte,
a vida eterna!";
outros retrucam:
"A vida mesma
é o eterno retorno!".

Enquanto isso,
nas tardes da eternidade,
o Mistério se engraça
das borboletas
recém saídas do casulo...
e dando boas gargalhadas
ama sua beleza.

DO COPISTA DAS PAISAGENS

Descrevo as montanhas
a desenhar horizontes...
amplos, largos, livres,
abertos aos sonhos.

Das planícies carrego
nas tintas das dunas
o lugar onde deito
minha vida peregrina.

Nenhum lago me cabe,
mar algum me divide...
somente um copo d'água
sabe minha sede de espaço;

aonde lanço a vista
das montanhas e mares,
horizontes e dunas;
ao regaço das iluminuras.

Uma borboleta amarela... após a chuva.

UMA BORBOLETA AMARELA

Uma borboleta amarela
descreve arabescos nos ares
por sobre flores selvagens.

Na cabana solitária
o velho copista ilumina um livro
com dourados capitulares.

Os arabescos da borboleta
iluminam o velho copista...
que capitula a pena... e parte.

PAISAGEM DEPOIS DA CHUVA

Árvores antigas
debruçadas no lago
espalham sombras ruídas.

Um peregrino sentado
contempla a brisa suave
afagar o campo molhado.

Por entre árvores, uma ave
esgrima com a brisa: amiga.
O peregrino, à sombra, nada sabe.

HAVERÁ SEMPRE

Haverá dia sempre
enquanto uma noite caprichosa,
carregada de nuvens de chuva,
deixar brilhar (por um momento)
uma lua redonda e prata.

Haverá dia sempre
enquanto um céu cinza
se converter em chuva
e cair num arco-íris risonho
sobre flores e crianças.

Haverá dia sempre
enquanto um sentimento
qualquer entrar pela porta
e fazer brilhar aquela antiga
alegria, na menina dos teus olhos.

Haverá dia sempre
enquanto a dádiva da vida,
repleta de promessas e horizontes,
abrir um encontro entre
a duração e o instante...

Para assim, por fim, transmutar
o que antes era espera (somente)
em um hoje (inteiro, pleno),
repleto pela graça do re-encontro
dos teus dias com o Sempre.

Um bardo (Gustave Doré)

CANÇÃO BÁRDICA

Fiz de minhas tripas
uma lira antiga e diáfana
para com ela semear
canções de ventos e brisas.

Fiz de meu peito
uma gaita soante e forte
para saudar ao pleno sol
emoções mais vivas.

Fiz de minha pele
um tambor arcaico e grave
para tocar a terra (inteira)
melodias de flor e carvalho.

Fiz com minhas mãos
abençoada elegia (druídica)
para que a chuva chegue
sem ocultar luar e estrelas.

Fiz de meu corpo (por completo)
o Corpo de todos os deuses
para que possamos, em uníssono,
cantar à Vida Plena...

Para só assim, por fim, fazer silêncio
(abrigo de toda palavra e canto)
um lugar con-sagrado aos seres,
como o cantar dos Bardos Antigos.

Borboleta Olho-de-Coruja.

O SÁBIO BORBOLETA

O sábio sabe
o sabor daquela flor.

A borboleta traça
o sentido da trajetória.

A vida sonha-se
a sabedoria a-flor-a.

O CANTO NOVO

Apesar das flores do mal
habitarem cada dia mais
os canteiros descuidados
de nossas almas profanas,
há de haver sempre
a Rosa Girassolada,
vestida de sol, a brilhar
em nossa carne sagrada:
sangue e corpo,
tendões e ossos (...)
inteiro ser que nos salva
do absurdo desumano
dos espíritos sem alma.

Mont Saint-Michel

DO FOGO

Dos seres, o mais vivo,
bicho em puro calor e luz;
flamejante.

Saber do Fogo, seu sabor quente,
aquilo que queima
ilumina e arde.

O Fogo, serpenteante ser,
irmão da Terra, filho do Ar,
das Águas é aquilo que gera,

o que faz nascer, quente,
mutação de tempos
em aeons de chamas.